campanhas / destaque_home / legislação / 2 de maio de 2015

Neste dia das mães, não quero flores, quero direitos!

Texto especial para o Milc de Mariana Sá*

Tem horas que eu sinto que o Brasil é o pior lugar para ser mãe e ser criança (sei que não é). O que mais me chateia é pensar que temos, sim, boas condições de oferecer algo melhor para mães, pais e crianças. Explico: temos leis bacanas, boas instituições, alguma estrutura, políticas públicas bem escritas, algumas até bem tiradas do papel, mas acredito que, no fundo-no-fundo, nós – como sociedade – não temos boas intenções para com as crianças e suas mães e seus pais (mulheres e homens como humanos criando humanos, resumido aqui na palavra maternidade).

Fico me perguntando se um dos motivos que fazem com que as leis e as políticas não saiam do papel (ou serem mal executadas quando saem) não é uma extrema má vontade com o ser humano e uma falta de prioridade total para tudo que diz respeito a ele: e a infância e a maternidade dizem respeito ao ser humano. Ou você acha que teremos uma sociedade bacana enquanto a infância e a maternidade não forem de fato prioridade?

Ainda acredito naquele ditado que diz que é preciso toda a aldeia para educar uma criança, mas cada dia que se passa, vejo esta aldeia ser reduzida: famílias menores, escolas piores, comunidades desintegradas, espaços urbanos inseguros, mobilidade urbana ruim, inflexibilidade do trabalho fora de casa, são condições que determinam a maneira como maternamos.

Todos estes problemas somados a uma mídia desrespeitosa que, em suas colunas, reportagens, editoriais e ficções, joga toda a responsabilidade dos males do mundo nas mães, que seriam as responsáveis por uma tal de educação doméstica, supostamente a solução da maioria das quizilas brasileiras, mas que não pauta bem os temas que favoreceriam a educação, a civilidade e a maternidade.

E sem esquecer dos anunciantes do tipo que finge não entender que não PODEM se dirigir às crianças, que não podem se meter na minha casa e plantar valores nos meus filhos, que invadem as ruas e os espaços de lazer com suas marcas e produtos, que interpelam as crianças nas prateleiras, nos games, nos livros, nas revistas e nas escolas. Anunciantes que parecem que estão em todo lugar, acenando com cores e sons para crianças sem capacidade de julgamento formada. Não podem, simplesmente porque é ilegal, imoral e engorda.

Empresários de mídia, do comércio, dos serviços e da indústria que enobrecem as mães de família nos seus filmes publicitários, e não oferecem a menor condição para que esta mãe esteja um tempo em casa provendo esta educação aos filhos na vida real – afinal estes também são empregadores e fazem com as leis trabalhistas o mesmo que fazem com a lei de direitos das crianças: lobby para que nada mude.

Neste dia das mães, não quero flores, nem homenagens, nem presentes.

Não quero receber e-mail marketing de empresa que anuncia para meus filhos.
Não quero receber brindes das empresas cujos representantes publicam nas redes sociais que as mães e os pais são os únicos responsáveis, ou se sentam comigo nas mesas de debate ou que e dizem que basta que eu diga “não”.
Não quero musiquinha melosa cantada no intervalo da programação de péssima qualidade que entra em minha casa recheado de abusos e assédios.
Não quero receber cartinha de deputado que se rende ao lobby e teme pelas suas amadas verbas de campanha.

Eu quero direitos!

Quero ganhar de presente pelo Dia das Mães o acolhimento de todos os pareceres, opiniões, pesquisas e estudos científicos de desqualificam a publicidade como de interesse para crianças. Quero que anunciantes e os publicitários se dobrem diante da Resolução 163 do Conanda1 e que obedeçam Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Código de Defesa do Consumidor, que já proíbem a prática desde muito tempo. Quero que a sociedade trate crianças de outro jeito, como prioridade, que de fato são!

É isso que eu quero, não quero flores!

2015-DIA-DAS-MAES

Ilustração especialmente concebida para o Milc por de Luciana Azevedo do lalelilolu, studio de ilustrações infantis com redação de Mariana Sá e finalizada por Pedro Serravalle, Freelance Design.

(*) Mariana é mãe de dois, publicitária e mestre em políticas públicas. É cofundadora do Milc e membro da Rebrinc. Mariana faz regulação de publicidade em casa desde que a mais velha nasceu e acredita que um país sério deve priorizar a infância, o que – entre outras coisas – significa disciplinar o mercado em relação aos direitos das crianças..

 

[1] A Resolução 163 do Conanda dispõe sobre a abusividade do direcionamento de publicidade e de comunicação mercadológica à criança e ao adolescente. Trocando em miúdos que diz por A mais B do que se trata uma publicidade abusiva e define claramente o que é “aproveitar-se da deficiência de julgamento e experiência da criança”, o que já é proibido pelo Código de Defesa do Consumidor desde 1990. Saiba mais aqui.


Tags:  dia das mães legislação políticas públicas

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Mariana Sá




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