publicidade de alimentos / 17 de junho de 2013

As cantinas e a omissão das escolas

Texto de Ana Cláudia Bessa*

Quando eu era criança, lembro de como era muito mais legal comprar o lanche da cantina da escola. Minha mãe raramente me dava dinheiro, e eu ficava com o olho comprido nas pizzas, salgados e cachorros quentes que vendiam na escola. E, já naquela época, era sinal de status comprar o lanche na cantina ao invés de levar da casa. Hoje, como mãe, repito o que minha mãe fazia comigo, não por ter aprendido dessa forma, mas porque realmente, além da economia no orçamento, a cantina da escola não vende quase nenhum alimento ou bebidas saudáveis.

Eu acho que a escola tem que intervir na cantina. A escola é um ambinte educacional. Como as crianças podem estudar ciências, corpo humano, saúde e chegar na cantina e ter aquele monte de porcarias? Por que só os pais têm que dar bons exemplos? E a escola, não? Ali é um lugar de aprendizado, afinal de contas!

Um especialista falou algo que eu achei muito pertinente: comer é a única coisa que a gente faz todos os dias. Comer de forma correta interfere na nossa sobrevivência e qualidade de vida. Usamos mais a alimentação do que a álgebra, do que as regras gramaticais. A escola não pode ficar fora da educação para a alimentação adequada.

Recentemente, uma reportagem informava que os pais estão usando um tal cartão pré-pago para controlar a qualidade do que os filhos comem nas cantinas de algumas escolas que oferecem esse tipo de serviço. Digamos que dos males, o menor. Antes assim do que deixar o consumo livre. Acho que o cartão resolve o problema dos pais, mas deixa a criança na frente de um monte de porcarias gostosas. E ela que se vire para entender que aquilo não pode, mas está sendo oferecido pela própria escola, que deveria educá-la. Os pais precisam cobrar da escola uma posição mais firme com relação àquilo que a cantina oferece.

O problema também mora no fato de que algumas famílias simplesmente mandam o mais prático para a criança comer. A criança não compra na cantina, mas leva um pacote de salgado chulezitos “assado”. Imagina a cara da criança que tem que comer uma maçã? Ok, cada família tem o direito de fazer suas escolhas, mas o salgaditos chulé, além de fazer mal pra saúde da criança que consome com regularidade, demonstra que a família dessa criança não está pensando na coletividade, ou seja, nas outras crianças. Se queremos um mundo mais humano e fraternal, temos que pensar na coletividade, sim.

Algumas escolas fornecem o lanche. Isso melhora um pouco, mas eu mesma, que já tive meus filhos numa escola que fornecia o lanche, tinha sempre que ficar atenta ao cardápio, que incluía biscoito em mais de um dia por semana, sucos de garrafa industrializados, sucos em caixinha (que são ricos em açúcar), pãezinhos ricos em gordura hidrogenada, essas coisas. Se o lanche é supervisionado por nutricionista, qual a justificativa para produtos não-saudáveis e a falta de variedade?

Nas escolas que têm cantina, usar o argumento de que as crianças precisam aprender a fazer escolhas não convence. Imagine se não vamos colocar casaco nos filhos num dia frio porque eles devem fazer suas escolhas! Assim como sair no frio sem casaco interfere na saúde deles, a alimentação mais ainda.

Como mãe, sei como é difícil questionar a escola, mas precisamos encontrar um caminho. As reuniões são momentos perfeitos para tocar em alguns pontos. Tente organizar um argumento curto e certeiro, mas não se omita. Se as escolas hoje nos tratam como clientes, então temos mais motivos ainda para cobrar certas posturas delas. A cantina é uma parte da “prestação de serviços”.

Mas se ainda assim for difícil falar sobre isso, queria lembrar a linda iniciativa de uma menina escocesa, Martha Payne, que resolveu criar um blog, o Never Seconds, onde posta fotos dos lanches para questionar e melhorar a qualidade do lanche fornecido por sua escola. Ela avaliava a qualidade, a higiene e a quantidade de garfadas. Seu blog em pouco tempo teve mais de 1 milhão de visitas e foi apoiado pelo renomado chef Jamie Oliver.

Uma menina, meus amigos. Somos pais, adultos.

Não podemos acuar diante daquilo que é importante para o futuro e para a saúde de nossos filhos.

*Ana Cláudia é mãe de dois meninos, ativista, blogueira, empresária, cofundadora do Movimento Infância Livre de Consumismo e idealizadora do projeto Futuro do Presente.


Tags:  alimentação infantil cantinas educação alimentar escolas merenda escolar

Bookmark and Share




Previous Post
Danone apresenta: Turma da Mônica no mundo dos corantes artificiais
Next Post
Marketing nas escolas não é brincadeira



Mariana Sá




You might also like






More Story
Danone apresenta: Turma da Mônica no mundo dos corantes artificiais
Texto especial para o Milc de Vanessa Anacleto* Qualquer mortal que vá ao supermercado acompanhado de filhos pequenos...