Elaborada de Debora Diniz, Mariana Sá e Vanessa Anacleto*
Na quinta-feira, 21 de maio de 2015, teremos mais uma Audiência Pública do Projeto de Lei 9521/01 quando estaremos de plantão acompanhando o desenrolar desta novela(veja aqui a ficha da tramitação que se arrasta desde 2001). Desta vez, não fomos convidadas para estar entre os debatedores e por isso, escrevemos uma carta:
Prezados senhores representantes de profissionais e de setores da atividade comercial,
É com o coração aberto que nos dirigimos a vossas senhorias para pedir que façam da audiência pública do PL 5921/01 um verdadeiro espaço de escuta e diálogo, e não de disputas e de confrontos. O que está em jogo é a saúde física e mental das crianças brasileiras.
Sabemos que dentro de cada uma das associações que os senhores representam existem pessoas. São pessoas com crenças, ideologias, histórias, cultura, sentimentos, dificuldades e limitações, exatamente como nós, mães que assinamos esta comunicação.
Na mesa de debate estará o Estado, que deverá atuar como mediador de interesses aparentemente conflitantes e desenhar uma solução, se possível de consenso. Mas nem a maior habilidade de mediação pode ser bem sucedida se ambos os lados não estiverem dispostos a escutar e a conceder um pouco. Se não nos ouvirmos, não haverá diálogo. E sem diálogo, a solução nunca será completa e segura.
Os seus representados estão desde 2001 polarizando com os movimentos sociais para evitar que o cenário mude. Mas mesmo com um PL atravancado em comissões, temos que reconhecer que as coisas já mudaram. Mudaram e vão continuar mudando, porque, como dizia o poeta “o tempo não para”. Não pára, mas também não anda na velocidade das crianças: ah, como crescem rápido!
Por outro lado, não sabemos se é possível, chegar ao desejado consenso que garanta a proteção da infância brasileira sem ameaçar a estabilidade econômica dos setores onde os senhores atuam. Sabemos que estas atividades encontram sucesso de acordo com algumas formulações e modelos de rentabilização máxima e nem sempre estes modelos levam em conta o bem estar da criança.
O mundo está mudando, a informação hoje circula muito melhor do que há décadas atrás e em pouco tempo, a totalidade dos consumidores possuirão capacidades e recursos para avaliar as condutas empresariais e só sobreviverão as marcas e os produtos que não ofendam a dignidade humana e planeta. Nossa missão, senhores, não é aprovar o PL 5921/01. Nossa missão é contribuir com disseminação da informação que falta aos consumidores. E sabemos que assim que nossa missão estiver completada a demanda pela regulamentação será irresistível.
Este prognóstico de consumidores bem informados deve ser assustador para aqueles que apostaram a sua vida num negócio, que amam o que fazem, que têm sob a sua responsabilidade a vida de trabalhadores e suas famílias e que ainda não conseguiram realizar que a maneira como se comunicam com as crianças possa ser abusiva.
Tampouco imaginaram uma forma de manter os negócios em pé que não esteja calcada no modelo da maximização dos lucros sobre os seres humanos, ainda em desenvolvimento, os nossos filhotes. Por isso consideramos natural e legítima a resistência à mudança dos setores que os senhores representam. Tão natural e legítima quando nossa necessidade de mudar.
Numa perspectiva histórica, não temos dúvida de que cada dia a propaganda está mais ética e sabemos que este avanço é o resultado das críticas feitas por indivíduos, movimentos e coletivos que rejeitam a marca que insiste em se comunicar de maneira abusiva. Podemos fazer melhor! Podemos juntos – sociedade civil e mercado – elaborar uma agenda de melhorias contínuas. Não seria melhor ir mudando aos poucos do que esperar este PL virar lei e ter que mudar tudo de vez? Vamos tentar atuar de maneira menos competitiva e passar para um modelo mais colaborativo, cooperativo, deixando de esticar tanto a corda? Quem sabe conseguimos, ao invés de cabo de guerra fazer uma brincadeira de pular cantando cantigas com ela?
Cordialmente,
As mães.
Desejamos um debate proveitoso:
Veja vídeos de audiências anteriores aqui, aqui e aqui
Imagem Criança e Consumo
(*) Debora é mãe de três, cofundadora do Milc, cursou Letras e Semiótica. É doula e educadora perinatal há 10 anos. Atualmente vive no Vale do Paraíba e é uma das coordenadoras da Roda Bebedubem. É ativista e implicante com a sociedade atual desde sempre. Co-fundadora do Milc e membro da Rebrinc.
Mariana é mãe de dois, publicitária e mestre em políticas públicas. É cofundadora do Milc e membro da Rebrinc. Mariana faz regulação de publicidade em casa desde que a mais velha nasceu e acredita que um país sério deve priorizar a infância, o que – entre outras coisas – significa disciplinar o mercado em relação aos direitos das crianças.
Vanessa é mãe do Ernesto, blogueira e autora do livro Culpa de mãe. Por causa disso tudo, ajudou a fundar o Milc e luta por um futuro sem publicidade infantil. É autora do blog materno Mãe é Tudo Igual e membro da Rebrinc.
Tags: #aprovaPL carta mercado PL 5921 publicidade infantil