Nesta coluna o Milc convida os leitores a enviarem suas dúvidas à especialista em Direito do Consumidor Melissa Areal Pires da Areal Pires Advogados Associados. No primeiro post uma mãe carioca fala sobre o excesso de atividades extracurriculares dos pequenos.
Pergunta – Bom dia, Milc!! Gostaria de dividir uma angústia com vocês sobre “criar necessidades” na infância. Minha filha que acabou de fazer 3 anos estuda em uma das creches mais caras da Zona Sul do Rio. Alguns dias atrás recebi uma circular sobre uma atividade extracurricular de Ballet, onde o custo mensal é de R$190,00 por mês que iniciaria na turminha dela. Detalhe: a aula é NO MEIO DO PERÍODO – 14:30h de segunda e quarta. Confesso que não acho vantagem nenhuma em matricular uma criança de 3 anos em uma aula de ballet, de 30 minutos de duração duas vezes por semana. Ela já faz uma atividade extracurricular que é natação (fora da creche), pois acho muito útil uma criança saber se comportar e se defender em uma piscina. Em contrapartida, acho ela pequena demais para se sentir excluída, já que a maioria das amiguinhas vai descer com o maiozinho rosa, e ela não. Tomei a decisão de ceder, caso ela se mostre realmente triste com a exclusão, mas já fui conversar com a creche sobre a minha posição. Caso a matricule, será TOTALMENTE a contra gosto. Gostaria de saber se, juridicamente falando, vocês têm informação da legalidade desse serviço. Desde já, agradeço. P.
Melissa – A tarefa de escolha da escola para os filhos é um grande tormento para muitos pais. Buscar informações sobre o perfil da instituição e o método pedagógico, e aliar estes fatores ao orçamento familiar disponível para esta despesa, pode evitar muitos transtornos e surpresas na relação com a instituição escolar. Eu diria que a primeira observação a ser feita pelos pais na relação com a escola dos seus filhos deve ser algo intuitivo no sentido da percepção, pelo senso comum, de condutas que possam vir a ser consideradas abusivas aos olhos da legislação. Temos uma proteção especial para nossas crianças, consumidores hipervulneráveis em toda e qualquer relação na sociedade, e esta legislação precisa ser observada por todos os atores envolvidos no processo educacional, custe o que custar. É com base nestas premissas que pretendo responder a nossa cara amiga leitora, que trouxe a nós uma dúvida muito interessante a respeito da oferta de atividades extracurriculares em creches, tais como, balé, natação, judô, inglês, etc. É preciso esclarecer que não há, em tese, impedimento legal para as creches ofertarem cursos extracurriculares. A oferta destas atividades complementares tem o objetivo de despertar a motivação, nos alunos e famílias, por uma experiência mais proveitosa na educação infantil, além de ser um diferencial no mercado. Estudos apontam que os alunos que praticam atividades complementares que vão além da teoria, respeitados os limites e faixa etária, apresentam melhor rendimento escolar. Em uma enquete publicada no site da Crescer, 37% dos pais disseram que planejavam colocar os filhos para fazer atividades extracurriculares duas vezes por semana; 20% responderam que matriculariam as crianças em cursos três vezes por semana; 18% disseram que optaram por quatro vezes na semana e 12%, uma vez por semana. Há famílias que deixam as crianças praticarem outras atividades todos os dias da semana: um total de 8% dos que responderam à pesquisa. Somente 4% dos pais disseram que os filhos não fariam cursos além da escola. É preciso observar as questões legais importantes, dentre elas: (i) estas atividades extracurriculares não podem ser obrigatórias para o aluno; (ii) se estiverem incluídas no valor da matrícula, devem ser detalhadas em contrato; (iii) se for o caso de estarem previstas dentro do período de aula, é preciso verificar se é obrigatória a presença da criança e o custo. Para além das questões legais, cujos esclarecimentos, muitas vezes, não convencem os pais e não tem o condão de esgotar a polêmica, é preciso que os pais façam uma profunda reflexão sobre o tema. Muitas são as dúvidas: qual o limite, como perceber o exagero, de quem dever ser a vontade de participar da atividade complementar (dos pais ou da criança). Sabe-se que o excesso de atividades não combina com o universo infantil e pode ser prejudicial ao desenvolvimento da criança. Além do excesso de atividades, muito importante também observar a preocupação da nossa cara amiga leitora com o sentimento de discriminação pelo fato de a sua filha não ter interesse em se matricular na atividade complementar, diferentemente do restante da turma. Não será nunca permitido, com a nossa Constituição Federal de 1988 em vigência, qualquer tipo de discriminação que a criança venha a sofrer em ambiente escolar e a escola precisa, juntamente com a família, solucionar o impasse, respeitando o melhor interesse da criança e a legislação específica sobre o tema.
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(*) Melissa é advogada graduada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Pós Graduada em Direito do Consumidor pela Universidade Estácio de Sá/EMERJ, com atuação profissional voltada para o Direito do Consumidor e Direito à Saúde. Membro da Comissão de Direito Médico e da Saúde da OAB/Barra da Tijuca/RJ. Membro da 1ª Turma do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/RJ. Colaboradora do programa de rádio “Reclamar Adianta” da Rádio Bandeirantes AM 1360. Autora de artigos publicados em veículos de comunicação renomadamente conhecidos, para os quais também colabora com as matérias jornalísticas. Sócia fundadora do Areal Pires Advogados Associados.
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