Texto de Silvia Düssel Schiros*
No dia 12/11 estive, com outras representantes do Movimento Infância Livre de Consumismo (MILC), no lançamento do documentário “Muito Além do Peso”, com direção de Estela Renner e produção de Marcos Nisti e Juliana Borges. Se assistindo ao trailer já tinha sentido um nó na garganta, assistir o documentário na íntegra me deixou com um nó no peito.
“Muito Além do Peso” mostra um retrato assustador da questão da alimentação no Brasil. Cerca de um terço dos brasileiros já enfrentam problemas de saúde decorrentes da má nutrição. Crianças pequenas chegam aos montes aos consultórios médicos com problemas cardíacos, motores, respiratórios e diabetes por conta da dieta pobre.
E se você achava que esse problema só afeta os moradores dos grandes centros urbanos, que levam uma vida frenética e não têm tempo de cozinhar ou mesmo sentar em um restaurante e pedir uma comidinha saudável, pense outra vez: o fast food e as “conveniências” alimentícias chegam aos locais mais remotos – até de barco em comunidades de difícil acesso. E são recebidos com festa pela população, que sai com suas sacolinhas plásticas cheias de “guloseimas”. Índios consomem macarrão instantâneo, massa de tomate pronta, bolachas recheadas e refrigerantes. É possível que tenham esquecido como viver com o que a terra dá.
Em uma pequena localidade afastada da “civilização”, o comércio local não vende frutas, verduras ou legumes, apenas produtos industrializados não perecíveis. Crianças pobres estão obesas e desnutridas, pois o refrigerante, os salgadinhos e as bolachas recheadas são a base da sua “alimentação”.
O cenário é de fato estarrecedor. Se antes eu já achava que a coisa ia de mal a pior, depois do documentário saí com vontade de gritar, de dar um “sacode” nas pessoas que consideram radical e dizem que “um pouquinho só não faz mal”. O problema é que de “pouquinho” esses produtos não têm nada: uma latinha de refrigerante tem o equivalente a sete sachês de açúcar; comer um pacote de bolacha recheada é o mesmo que comer oito pãezinhos franceses; a quantidade de óleo de um pacote de salgadinho é suficiente para cozinhar para um batalhão.
E a teoria do “um pouquinho só” vai por água abaixo quando a gente se dá conta de que a fórmula desse lixo comestível é feita para que a pessoa nunca fique satisfeita. Ela se empanturra e uma hora depois já sente fome outra vez. Os produtos alimentícios são drogas legalizadas e baratas. Por conta dos problemas de saúde que geram, deveriam sofrer uma tributação pesada e ainda vir com um alerta igual ao dos cigarros.
Um dos entrevistados afirma: nós somos o produto das empresas. O que elas produzem? Consumidores insatisfeitos que só se sentem “felizes” consumindo cada vez mais.
Precisamos, com urgência, que a sociedade abra os olhos para o problema e cobre, de maneira contundente, do Estado e das empresas medidas legais e educativas drásticas para curar nossas crianças e protegê-las desse assédio imoral.
*Silvia é mãe de duas meninas, tradutora e ativista de causas do bem.
** Atualização: O Instituto Alana disponibilizou o documentário “Muito Além do Peso” para ser assistido na íntegra. Acesse: http://www.muitoalemdopeso.com.br/
Tags: documentário Estela Renner fast food Muito Além do Peso obesidade infantil produtos alimentícios

0 Comment
Fico também estarrecida com o que acontece com as crianças atualmente, comem supermal e são sedentárias. Quando minha filha passou para a escola atual (há 3 anos, ela tinha 6 ou 7 anos), e eu comentei com a diretora que ela tinha saído de uma creche onde o consumo de frutas era estimulado e o biscoito recheado não era permitido no lanche. E agora, nessa nova escola, minha filha Marianna estava se sentindo diferente por não levar biscoitos recheados para o lanche…Sugeri a diretora de fazer uma campanha para explicar os males desse tipo de biscoito para crianças…Ela simplesmente disse que isso seria impossível, pois o “esquema” de creche é diferente de uma escola, ela não podia interferir na alimentação que a criança traz de casa. Mari não toma refrigerante na escola, mas se quisesse teria na cantina. Ela não leva frutas p/escola, mas come bastante em casa. Fico também espantada de ouvir de crianças da idade dela que não gostam de fruta…com 10 anos!! Enfim, lógico que essa campanha começa de casa, mas todos têm que participar, principalmente a escola. Parabéns pelo texto. bj Anna
Anna, essa bola de que a escola também tem um papel importante na educação foi levantada no documentário e no debate posterior. Eu acho essencial que a escola reconheça o seu papel de educadora também neste sentido. Não lembro quem falou isso lá (estava ouvindo e tomando notas – no escuro – ao mesmo tempo), mas nas escolas as crianças aprendem, em sala de aula, o que é uma alimentação saudável e, quando saem para a hora do recreio, não encontram esse tipo de alimentação nas cantinas. As escolas PRECISAM assumir o papel de educadoras neste sentido. E não adianta trabalhar só com a teoria: levar a teoria para a prática é essencial.
O trabalho de conscientização é difícil, e o que você fez na escola da Marianna é importante, e infelizmente, se quiser ver mudanças, você vai ter que insistir com doçura. 🙂 De vez em quando, mande um link, um texto, uma reflexão para a direção e a coordenação. Fale com os pais. Água mole em pedra dura… 😉 Beijo pra você!
Anna, o documentário já está disponível para baixar online. Assista e tente levar para a escola, para reflexão.
Matou a pau, Juvenala!
😀
Ótimo texto Sílvia! Queria muito ver o filme, mas acho que não vai ser exibido fora do Brasil… vou tentar comprar online se sair…
Eu vi a versão em inglês… muito bom, mas tô curiosa pra saber da realidade brasileira. Abs