O Movimento Infância Livre de Consumismo (Milc) sempre defendeu a Classificação Indicativa como medida de proteção às crianças e de autonomia de mães e pais. Participamos de audiência pública e de curso sobre o tema ministrado pelo Ministério da Justiça e concluímos que é uma boa política pública – é um bom exemplo de corregulação feita pelo mercado e pelo Estado sob o olhar a sociedade.
Obviamente, como todas as ações de estado, a Classificação Indicativa também deve ser alvo de monitoramento, de controle social, para que melhorias sejam implementas quando percebidos limites e vulnerabilidades (como, por exemplo, pensar numa estratégia para que peças de teatro e exposições artísticas, entre outras produções, possam ser classificadas, deixando para as mães e pais a decisão de levar crianças ou não, como hoje acontece nos cinemas e diante de uma tevê).
Tudo isso para dizer que assinamos em baixo da defesa à Classificação Indicativa feita pelo Intervozes. A tentativa de acabar com a Classificação Indicativa para mostrar que esse governo faz algumas é irresponsabilidade e oportunismo! É vender a ilusão que foi sua ineficácia que causou as recentes polêmicas. Ilusão!
O que vemos hoje no Estado é uma situação de desmonte das poucas políticas que funcionam bem, mesmo que prejudique a maioria da população.
O que sentimos hoje diante das casas legislativas e dos governos das diversas esferas é uma total falta de confiança.
Se há pouco mais de um ano acreditávamos na possibilidade de uma regulamentação da comunicação mercadológica dirigida à criança, hoje não acreditamos que este parlamento e este governo tenham a legitimidade e a capacidade requeridas para formatar uma medida que atenda com efetividade os interesses das crianças e das suas famílias: olharemos com muito desconfiança qualquer modificação profunda e recomendamos a nossas leitoras e leitores que façam o mesmo.
As duas recentes exposições polêmicas estão sendo utilizadas como subterfúgio para derrubar uma medida contra a qual já havia um intenso lobby protagonizado especialmente por associações de donos de emissoras e anunciantes.
Então para nós, como sempre e mais do que nunca, urge nos posicionarmos a favor da continuidade e melhoria da Classificação Indicativa e totalmente contra o seu desmonte.
Quem ganha com o fim da Cidade Indicativa? As emissoras e anunciantes que não terão os limites impostos hoje para exibir conteúdos com linguagem chula, sexo, tortura, violência, estupro, suicídio, nudez e consumo de drogas, com grande apelo da audiência em qualquer horário. Se você acha que o que temos hoje é ruim, saiba que o fim da Classificação Indicativa fará isso piorar. Quem perde? AS CRIANÇAS, AS MÃES, OS PAIS E OS EDUCADORES.
(*) Mariana Sá é mãe de dois, publicitária e mestre em políticas públicas. É cofundadora do Milc e membro da Rebrinc. Mariana faz regulação de publicidade em casa desde que a mais velha nasceu e acredita que um país sério deve priorizar a infância, o que – entre outras coisas – significa disciplinar o mercado em relação aos direitos das crianças.
Confira a Nota Pública :
Nota pública sobre as declarações do Ministro da Justiça acerca da Classificação Indicativa
As instituições que subscrevem este documento recebem com extrema preocupação as declarações do Ministro da Justiça, Torquato Jardim, acerca da política brasileira de Classificação Indicativa de obras audiovisuais, publicadas na coluna da jornalista Monica Bergamo, da Folha de S. Paulo, no último dia 4 de outubro.
Antes de tudo, surpreende o desconhecimento do Ministro a respeito dos aspectos essenciais de uma política que está sob sua direta responsabilidade. Ao contrário do que afirmou, não há “uma repartição em Brasília para dizer a idade em que se pode assistir a novela e cinema no país”. O modelo de classificação vigente, regrado pela Portaria MJ nº 368/2014, opera segundo o princípio da corregulação, priorizando o processo de autoclassificação de conteúdos. Dessa forma, está majoritariamente nas mãos dos próprios produtores das obras audiovisuais a prática classificatória, cabendo à equipe da Coordenação de Classificação Indicativa, órgão vinculado à Secretaria Nacional de Justiça e Cidadania do Ministério da Justiça, realizar o monitoramento do sistema.
A efetividade desse modelo é evidenciada, em especial, pelos indicadores relativos à autoclassificação das séries e telenovelas, que apontam para pouquíssimos casos de divergência entre aquilo que as emissoras definem e a ação de supervisão exercida pelo Ministério. Esse contexto harmonioso que predomina entre as partes envolvidas nos procedimentos relativos à política é corroborado pela pesquisa “Classificação Indicativa nos Tribunais: elementos jurídicos da política”, produzida pela FGV Direito-SP, a qual registra um grau mínimo de litigiosidade em torno do sistema em vigor no país.
Tais dados não oferecem sustentação, portanto, ao comentário do ministro de que esse sistema seria “uma loucura”. Na verdade, o modelo brasileiro de Classificação Indicativa conta com o reconhecimento de autoridades como o Relator Especial sobre a Promoção e Proteção do Direito à Liberdade de Opinião e Expressão das Nações Unidas (ONU) e o Relator Especial para a Liberdade de Expressão da Organização dos Estados Americanos (OEA), precisamente por estar alinhado aos padrões internacionais para a garantia dos direitos de crianças e adolescentes no campo da comunicação de massa. Esse arranjo corregulatório é adotado amplamente pelas nações democráticas, entre as quais os Estados Unidos, ao contrário do que sugere o ministro na nota mencionada.
Não bastassem esses elementos, a Classificação Indicativa também se destaca como uma política que efetivamente serve à população brasileira, que a valoriza e legitima. Segundo levantamento realizado em 2014 pelo Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas, 72% dos respondentes avaliaram a política com o conceito “ótimo/bom”, enquanto 20% a consideraram “regular” e apenas 7% marcaram “ruim/péssimo”.
Por fim, a afirmação do ministro de que “está na hora de a sociedade assumir isso” soa, no mínimo, como um contrassenso, pois parece desconhecer a existência do Comitê de Acompanhamento pela Sociedade Civil para a Classificação Indicativa (CASC), vinculado ao próprio Ministério, que reúne diversas organizações que fazem o monitoramento desta política pública – várias delas signatárias desta nota.
Criado pela Portaria MJ nº 25/2012, o Comitê tem o objetivo de ser um instrumento de avaliação permanente da política pública, por meio do compartilhamento periódico de impressões, críticas e sugestões entre a sociedade civil e a equipe responsável pela operação do sistema classificatório. Essa iniciativa é convergente com a abordagem adotada pelo Ministério da Justiça, ainda no período de formulação da política (2005-2007), que envolveu em processos de consulta pública e debates os diversos setores interessados e estudos sobre os modelos de classificação utilizados por outras democracias.
Por mais de dois anos, entretanto, o Ministério da Justiça deixou de convocar as reuniões semestrais do CASC, alijando a sociedade de seu direito de contribuir para os rumos da política. Sua última reunião, realizada em setembro passado, só veio a concretizar-se após ampla insistência dos membros do Comitê. Agora o ministro fala em transferir para a sociedade uma obrigação que, segundo a Constituição Federal, é também do Estado brasileiro.
Em síntese, a política de Classificação Indicativa é um dos raros exemplos de prática de corregulação efetiva no campo da mídia hoje em vigor no Brasil. Ela é bem sucedida ao dar vazão aos princípios constitucionais de preservação da liberdade de expressão, rechaço à censura e garantia dos direitos da criança e do adolescente.
Em um momento em que o debate sobre a Classificação Indicativa volta à tona, cabe a este Ministério reforçar seu caráter democrático e participativo, de central importância para a infância e adolescência brasileiras, ao invés de sinalizar com o seu desmonte.
Brasília, 09 de outubro de 2017.
Nota publicada em http://bit.ly/notaintervozes
Resumo:
Tags: classificação indicativa Classificação Indicativa e a Proteção de Crianças e Adolescentes