Texto de Paloma Varón*
No fim de 2012, recebi um release, uma “sugestão de pauta” para o meu blog pessoal – que não é nem nunca foi comercial –, que, dentre tantos outros que recebo quase que diariamente, me chamou a atenção. Era da empresa fabricante do Sustagen Kids no Brasil, que enviava para mim sugestões de lanches saudáveis (sim, saudáveis, era este o apelo) usando o produto deles para eu publicar no meu blog de graça. Que lindo, quanto desprendimento, quanta generosidade…
Já estou acostumada com este tipo de abordagem e nem respondo a estes e-mails. Tá, como jornalista que também já atuou como assessora de imprensa, eu poderia dar um toque e dizer: “Você está fazendo isso errado, amiga”, mas preferi escrever isso aqui, assim o toque fica mais amplo, não só para a equipe de assessoria de imprensa, mas para as outras blogueiras, que como eu, recebem rotineiramente releases semelhantes, e para quem mais se interessar sobre o assunto.
Para começar, a primeira receita é de bicho-de-pé, aquele docinho que parece brigadeiro, mas que é cor-de-rosa. Olha, você pode achar bicho-de-pé bonito, gostoso, a sensação da festa infantil, mas… saudável? Sinto lhe informar, ele não é não. Com ou sem Sustagen Kids na receita, continua sendo um doce com uma quantidade absurda de açúcar. Aliás, fica a dica: um brigadeiro feito com um achocolatado sem açúcar ou mesmo cacau puro é muito menos doce, portanto, menos prejudicial à saúde. Nem vou entrar na discussão dos corantes e de todos os produtos químicos que existem naquela lata. Também não vou discutir o fato de que a receita proposta leva margarina em vez de manteiga.
O ponto mais importante aqui é que Sustagen Kids não é um produto legal – na medida em que é industrializado e não é indicado para qualquer criança “que não come frutas e verduras”, como a propaganda faz parecer – e não vai ser adicionando-o a receitas também pouco saudáveis que vamos, por um passe de mágica. “saudabilizá-las” (neologismo que acabei de criar, deu para entender, né?).
O problema é que o suplemento acima referido, assim como outros do gênero, por meio de anúncios em que a criança não almoça e recebe um copo de Sustagen Kids em troca, caíram nas graças de muitos pais e mães, que acham que eles são a salvação da lavoura, afinal, a maioria dos pais acha que seu filho come menos do que realmente come.
“Se por um lado temos nossa responsabilidade de pais com o que nossos filhos comem, a publicidade também não pode se eximir da responsabilidade dela em anunciar seus produtos de forma a ‘munir’ as crianças com argumentos de convencimento para as compras. A indústria de alimentos também tem uma boa parcela de culpa por produzir alimentos com qualidade nutricional ruim. E o governo, que conta com pouquíssimas iniciativas em favor do consumidor, também precisa tomar a rédea da regulamentação da publicidade de alimentos”, é a opinião da nutricionista Claudia Olsieski da Cruz.
Claudia é mestre em nutrição pela UERJ e doutoranda em Alimentação, Nutrição e Saúde pela mesma universidade. Professora da área de Nutrição Social da Universidade Estácio de Sá, casada e mãe de um menino de 8 anos. Estuda a relação da publicidade de alimentos com o consumo alimentar, bem como a regulamentação do setor. Para saber mais, leia a entrevista que publicaremos na quinta-feira, dia 21 de fevereiro.
*Paloma Varón é mãe de duas, jornalista, blogueira, defensora dos direitos da infância e da mulher, entre outras tantas coisas que a definem. Baiana, idealista, curiosa, agitada, expatriada na Eslovênia.
Tags: olhar crítico sugestão de pauta Sustagen Kids