publicidade de alimentos / 18 de setembro de 2014

As frutas, as ceras e o direito à informação clara

Se todos tivessem informação suficiente, algo tão prosaico como a descoberta de uma camada de cera, supostamente natural, não causaria pânico ou geraria tanta polêmica. Mais uma vez insistimos na necessidade da indústria se comunicar melhor com o consumidor, bem como demandamos mais atuação do Estado.

Compilamos todos os comentários e informações que recebemos, e entendemos perfeitamente que existe a cera produzida espontaneamente por algumas espécies de maçãs (e outras frutas e flores), existe a cera de origem natural aplicada pelo produtor e existe a cera derivada do petróleo.

Existem empresas que produzem e comercializam ceras diversas para produtores de fruta. Existe o procedimento de repor esta cera catalogado e regulado pelas autoridades sanitárias. Os produtores compram e fazem a reposição da cera para compensar as perdas de cera da própria fruta durante as lavagens destinadas a retirar excesso de venenos diversos (pesticidas, fertilizantes etc.).

Ok! Bacana! Somos capazes de entender isso. Mas ainda continuamos em dúvida: qual é a cera da maçã que estamos comprando? É a espontânea? É reposta, derivada de componentes naturais? É a produzida a partir do petróleo? Acho que temos o direito de saber se houve reposição da cera e de que cera estamos falando. Só sabendo isso, poderemos fundamentar nossa escolha e assumir os riscos que queremos correr.

E mais: o Estado, por meio dos órgãos fiscalizadores, tem a obrigação de fiscalizar e testar os produtos para ver se o que está no rótulo é verídico. Estamos cansados de ser considerados alienados. Estamos cansados de consumir produtos de procedência incerta.

Não temos aqui a pretensão de fechar um consenso sobre a segurança desta ou daquela cera, mas demandamos que a indústria que se apossa de produtos in natura seja clara quanto aos seus procedimentos de manuseio, conservação, transporte e armazenamento.

Arival Pioli, dizendo ser porta-voz do produtor brasileiro, deixou uma nota na nossa página. Confira:

“Por meio do presente documento, a Associação Brasileira de Produtores de Maçã – ABPM, uma sociedade civil sem fins lucrativos, criada em Porto Alegre em 1978, com endereço na cidade de Fraiburgo – SC, na Rua Nereu Ramos, no. 1064, inscrita no CNPJ/MF sob o nº 89.519.201/0001-03, entidade cujos associados representam 75% da produção nacional, 85% da comercialização no mercado interno e 95% das exportações, após tomar conhecimento da divulgação de vídeo na internet, no qual a senhora questiona a presença de cera em maçãs, vem esclarecer e pedir o que segue.

Inicialmente, importa ressaltar que o acúmulo de ceras sobre a casca de frutas, folhas e até mesmo sobre flores, é um processo natural do desenvolvimento de algumas plantas. A formação da cutícula sobre a parede das células da casca ocorre desde o início do desenvolvimento dos frutos e tem a função de protegê-los contra estresses do meio ambiente tais como vento, temperatura e seca, não apenas quando o fruto está ainda ligado à planta mãe, mas também após a colheita.

Entre as demais funções desta cera natural da fruta, ela é responsável por evitar a sua desidratação depois que a colheita é realizada, bem como melhora a troca gasosa na respiração, podendo prevenir contra ataque de fungos decompositores, além de realçar a cor e o brilho natural da maçã. Esta camada natural de cera pode ser mais ou menos espessa em função de características como Cultivar, época de colheita, período em que a fruta ficou armazenada, região de produção e principalmente em função do clima sob o qual a fruta foi produzida, (clima mais quente ou frio, maior período de insolação, chuva e etc.).

Estas informações estão baseadas na seguinte bibliografia científica: “ARGENTA, L. C. Fisiologia e tecnologia pós-colheita: Maturação, colheita e armazenagem dos frutos In: A cultura da macieira.1 ed.Florianópolis : EPAGRI, 2006, p. 691-732.”

Os produtores de maçã do Brasil não fazem a aplicação de qualquer tipo de cera em maçãs, pois a ela já é produzida naturalmente e em quantidades suficientes. A produção de maçãs no Brasil, por sua vez, é certificada com protocolos internacionais, o que permite a exportação de frutos para mercados exigentes, como o da Alemanha e da Inglaterra, onde a maçã integra o programa de merenda escolar. Reconhecemos, outrossim, que em alguns países a aplicação de óleos naturais comestíveis (de carnaúba) sobre frutas tais como maçãs, laranjas e outras é bastante comum, mas no Brasil essa tecnologia não é empregada.

Em vista do exposto, não se justifica a divulgação das informações equivocadas no vídeo postado em rede social.

Para aqueles que preferem se informar melhor antes de seguir pessoas inconsequentes, recomendamos a bibliografia abaixo:

Lincoln Taiz, L.; Zeiger, E. Plant Physiology, Sinauer Associates, Inc. Publishers, Sunderland, Massachusetts. Fifth Edition. 2010, 782p.”

A partir dessa declaração, refletimos que o Estado não permitiria ou regularia o uso de GLACEANTE em frutas in natura (embaladas e com tratamento de superfície) se o produtor não usasse. A Anvisa permite cera de abelha (branca e amarela) INS 901; cera de candelilla INS 902; cera de carnaúba INS 903; goma laca, shellac INS 904; cera microcristalina INS 905c i; e cera de polietileno oxidada INS 914.

Siga os links e tire as suas conclusões.
Definação de Shellac pela Wikipedia
Cera nas Maçãs – Beste Food Facts
Aplicação de cobertura Comestíveis – Fabesp

Fizemos um passeio e coletamos alguns comentários na web para ajudar o nossa leitor a formar a sua opinião:

Do campo à mesa: Novos esclarecimentos. A profª Drª Marta H Fillet Spoto, da área de Frutas e Hortaliças do Departamento de Agroindústria, Alimentos e Nutrição da ESALQ/USP, diz que “existe nos frutos, como a maçã, uva, manga, etc. uma cera natural que se chama pruína, que é importante para a manutenção da qualidade dos mesmos. Após colhido, o fruto continua sua ontogenia, respirando, transpirando, etc. e essa cera evita a transpiração excessiva e murchamento rápido do fruto. No caso da uva, por exemplo, a colheita é realizada de maneira cuidadosa para a não retirada da pruína, a qual se apresenta como uma fina película esbranquiçada. Mas não devemos confundir com a aplicação exógena de alguns produtos, como algumas ceras naturais, a carnaúba por exemplo, que são adicionados, principalmente em frutos dos quais são retiradas as cascas para o consumo. Outros, como a quitosana, amido, cera de abelha, etc, são comestíveis e não há necessidade da sua retirada. Enfim, todo o produto adicionado ao alimento deve passar rigorosamente pelo órgão regulador competente para ser consumido.” Perguntei como podemos saber se a cera na fruta é natural ou adicionada. Ela respondeu que “só mesmo com análises específicas para se ter certeza, mas às vezes pela aparência você pode desconfiar, por exemplo, quando o fruto estiver com manchas brancas irregulares e espessas ou quando for demasiada a camada de cera”.

Milc: Raquel Paul Leitão: Olá! Sou engenheira de alimentos e este assunto me deixou curiosa. Pelo que eu analisei rapidamente, ceras aplicadas em frutas não são prejudiciais à saúde, com exceção de ceras provenientes de petróleo, de acordo com o site: http://www.arimifoods.com/wax-coating-apple-fruits…/. Pode ser usada cera de carnaúba, de polissacarídeos, etc. Porém, pelo que vi na legislação brasileira, pode ser aplicado cera de polietileno oxidada como glaceante (http://portal.anvisa.gov.br/…/RDC+N+08++2013+Aditivos…), que possivelmente tem origem do petróleo. Não encontrei nada falando se a aplicação desta cera de polietileno é prejudicial à saúde. Espero ter contribuído um pouco sobre o assunto.

Daí pesquisamos reportagens e site de produtores de cera:

PROTEGE – Cera de carnaúba: Extraída das folhas da carnaubeira, palmeira típica do Nordeste brasileiro, é a cera mais dura que existe – só derrete acima de 80 ºC. Além de proteger a pintura contra sol e chuva, ela dá brilho à lataria. Também é usada para dar lustro à casca de maçãs. Sim, em pequenas quantidades, a cera é comestível (em grandes, dá diarreia). 

Santana Ceras – O enceramento das frutas objetiva repor a cera natural da casca, parcialmente perdida com o amadurecimento e removida nos processos de beneficiamento. As frutas e hortaliças são organismos vivos com 80-90% de água em peso. A cera normalmente aparece quando a fruta atinge dois terços do seu crescimento. Se ocorrer a perda dessa camada protetora natural, a água começa a permear e evaporar rapidamente, resultando num produto desidratado, sem aparência de fresco. Para se obter uma vida prolongada de frutas ou hortaliças, é fundamental a prevenção da perda da água, mantendo os elementos vitais dos alimentos próximos aos do momento que são colhidos. Assim, o recobrimento da superfície tem sido empregado extensivamente para reduzir a perda de água, a difusão de gases, a movimentação de óleos e gorduras, a perda de sabores e aromas. Além disso, as coberturas melhoram as propriedades estruturais e a aparência externa do produto, e podem incorporar pigmentos, aromatizantes e aditivos. Considerando-se que o primeiro critério usado pelo consumidor no momento da escolha de um produto é visual, então o brilho conferido pelo enceramento torna-se o principal benefício do uso da cera para efeito de comercialização das frutas.

A aplicação de ceras auxilia na redução das perdas pós-colheita, em especial quando realizada em conjunto com outras ações adequadas ao produto, como seleção de variedades, manuseio e beneficiamento cuidadoso,controle de doenças na pós-colheita, utilização de reguladores de crescimento, resfriamento, irradiação e operações de embalagens no armazenamento apropriadas. Além de conferir brilho após o polimento, a cera reduz a murcha e aumenta a vida de prateleira das frutas.

Uma vez estabelecida a concentração adequada a cada fruta, inicia-se o processo de enceramento mecanizado ou manual. No enceramento mecanizado utiliza-se máquina aplicadora de cera na qual, durante o deslocamento, as frutas são pulverizadas com a emulsão de cera, passam por um túnel de secagem e depois por rolos de polimento. O enceramento mecanizado é usado apenas nas frutas com forma geométrica tendendo para a esfera ou elipse, como laranja, limão, tangerina, goiaba, maçã, nectarina, pêra, dentre outras. Já o enceramento manual pode ser usado em qualquer tipo de fruta. Neste caso, as frutas são submersas em tanque contendo a emulsão de cera; do tanque são colocadas em bandejas que se deslocam por um túnel de secagem e depois são enceradas manualmente usando-se flanela até a fruta brilhar. Deve-se evitar o polimento excessivo, o qual pode danificar a casca da fruta.

Apesar de a cera poder ser aplicada a todas as frutas, propiciando os benefícios da redução da murcha e o aumento da vida de prateleira, em alguns tipos de fruta não é possível o polimento para dar brilho, seja pela anatomia da fruta ou pela delicadeza da casca ou por ambas. A banana é um exemplo com ambas as restrições ao polimento. Já no abacaxi o polimento não é possível devido à irregularidade e aspereza da casca. No caso das frutas em cachos, como a uva, o enceramento não é utilizado, pois as bagas ficariam grudadas pela cera, além de que o polimento seria impraticável.

Finalizando, a preocupação com a aparência e durabilidade dos produtos no mercado de frutas de mesa deixou de ser privilégio dos países da Europa e dos Estados Unidos, passando a ser uma necessidade do mercado brasileiro em decorrência da estabilidade econômica, a qual propiciou ao consumidor o poder de escolha na hora da compra. Consequentemente, brilho, firmeza e durabilidade são atributos indispensáveis às frutas.
Arimi Foods – Conclusion Waxes used on apples are *at the moment* considered as safe for human consumption. However, governments are supposed to enforce strict measures to ensure some petroleum-based waxes are not used. The producers are also required to indicate on the label if additional wax has been used to coat the fruit. (grifo nosso)To be on the safe side as a consumer, thoroughly clean the apple fruit before enjoying the tartness and crispiness of the apple.  —> Conclusão: as ceras utilizadas em maçãs são consideradas, *neste momento*, seguras para consumo humano. No entanto, espera-se que os governos estabeleçam medidas rígidas para assegurar que determinadas ceras derivadas do petróleo não sejam utilizadas. Os produtores também devem indicar no rótulo se algum tipo de cera adicional foi utilizado para revestir a fruta. (grifo nosso) Para garantir a própria segurança, o consumidor deve lavar bem as maçãs antes de de saborear sua deliciosa crocância.

Abaixo, mais alguns links de fontes confiáveis que consideram o uso da cera comum e “recomendável”:

Trabalho acadêmico apresentado ao Curso de Bacharelado em Química de Alimentos da Universidade Federal de Pelotas, como requisito parcial da disciplina de Seminários em Alimentos.

Feagri – Unimac – Beneficiamento de Frutas e Hortaliças

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Tags:  cera maçã maçã com personagem maçã embalada polêmica

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Mariana Sá




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