Texto de Maria da Silva*
No início de março, fui com minha família a um aniversário na lanchonete do palhaço. Já frequentei muitas vezes esta rede de fast food, principalmente na adolescência, mas desde que minha filha foi apresentada ao mundo dos alimentos sólidos, o que me introduziu no mundo das reflexões sobre alimentação saudável, eu não frequento suas lanchonetes. E por sorte do destino, até então nenhum convite destes tinha surgido. Aliás, quando o convite chegou, vivi alguns minutos de impasse, com uma vontade enorme de ignorá-lo e tocar a vida como se nada tivesse acontecido. Mas o aniversariante é uma criança muito próxima e querida de nós. Então respirei fundo, comprei o presente e fiquei me repetindo que uma vezinha na vida não traria tantos danos.
Quando a garçonete chegou, minha filha, que tem mais dedos numa mão que lanches comidos nesta rede em seus 6 anos de vida, não hesitou em pedir o lanche do brinde. O marido pediu uma oferta qualquer, e eu fiquei lá, com o cardápio na mão sem saber o que pedir. Perguntei à garçonete se algum daqueles sucos era da fruta – chega a ser uma pergunta estúpida, né? Disse que pediria depois e fiquei conversando e rindo, que é o que realmente importa em uma festa de aniversário. Alguns minutos depois ouvi alguém perguntar ao filho se comeria a maçã, e um sorriso me veio ao rosto.
A maçã, claro! Lembro-me bem quando a rede de fast food alardeou em todos os meios de comunicação que se preocupava em tornar seus lanches mais saudáveis, introduzindo maçã. Mas como já não frequentava mais a lanchonete na época, nunca soube como a maçã era servida. E lá estava um pacotinho plástico com a logomarca da rede e alguns pedaços de maçã dentro. Foi meu marido quem levantou a questão: “Nem sei se vale a pena comer! Como essa maçã não fica escura?” É verdade! As fatias da fruta estavam como se tivessem acabado de ser cortadas. Virei a embalagem em busca da lista de ingredientes, o que, convenhamos, é algo um tanto esdrúxulo, já que maçã é feita de… MAÇÃ!!! Aha! Mas não a maçã do lanche feliz, que além de maçã possui antioxidante INS 300 e estabilizante INS 509 – eis o segredo para elas permanecerem por tanto tempo como se tivessem sido cortadas naquele segundo! Aliás, quanto tempo será que aqueles pedaços de maçã estavam naquela embalagem? Resolvi aceitar o copinho de água que a garçonete passou oferecendo enquanto lamentava a minha ignorância e ingenuidade de pensar que a maçã do lanche era simplesmente a fruta inteira e lavada, como a propaganda sugere.
Chegou a hora dos parabéns, e quando o aniversariante começou a cortar o bolo pensei que talvez este não tivesse sido feito pela lanchonete. Aproveitei que estava ao lado de uma garçonete e perguntei: “Esse bolo também foi feito por vocês?”. “Não, os bolos vêm de São Paulo”. Arregalei os olhos incrédula: “Vêm de onde?”. “De São Paulo”, ela confirmou. Vejam bem, eu moro no Nordeste, e aquele aparentemente inofensivo bolo de chocolate, feito sabe-se lá quando, viajou quase 2.000 km para chegar até a minha frente. Voltei pra mesa tentando lembrar o que tinha na minha cozinha que pudesse ser comido imediatamente.
Já dentro do carro, de volta para casa, ouvi minha filha dizer: “Engraçado, né? Nem parecia uma festa de aniversário!”. É verdade, não parecia mesmo. Tirando a amizade e o carinho entre as pessoas, tudo ali era artificial demais, plastificado demais, “conservado” demais. E eu fico aqui pensando como eles conseguiram convencer a população em geral de que ali é lugar de alegria e alimentação para crianças. A infância realmente precisa de mais respeito!
Em tempo: para ter o direito de tirar a foto do pacote de maçã, fui à lanchonete comprá-la fora do combo (que, claro, não me interessa) e paguei inacreditáveis 4 reais por 35g de maçã, como pode ser constatado na foto abaixo.
*Maria é mãe de uma menina de 6 anos e acredita que um futuro feliz depende de uma infância respeitada hoje. Ela assina sob um pseudônimo para preservar a identidade das pessoas envolvidas.
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