Este é continuação do artigo que lista Argumentos furados a favor da publicidade infantil. Uma lista que não tem fim em três ou quatro piscadas de olhos. A movimentação financeira que gira em torno da comunicação mercadológica dirigida a crianças é gigantesca. Natural que argumentos de defesa brotem aos borbotões. Não que eles valham alguma coisa, mas eles brotam. Hoje trago mais um desses argumentos e sua falta de sentido.
4- Ao invés de proibir a publicidade infantil devemos educar os pais. (Sim, a culpa é deles, lembram?)
A pergunta agora é: Educar os pais para que exatamente?
Vivemos tempos difíceis. Durante toda a história da humanidade, os seres humanos procriaram e cuidaram de suas crias. Contaram sempre com a ajuda dos mais velhos na família, comunidade ou na tribo. De uma hora para outra, tudo mudou. Existe então a crença de que os pais precisam ser “educados” para a paternidade. As pessoas, isto é propagado aos quatro ventos, não sabem mais lidar com os filhos. Uma série de publicações de todos os níveis e formatos são editadas a todo momento e em diversas mídias, formuladas por especialistas em diversas áreas. Estas publicações são destinadas a educar os pais, dar dicas, fórmulas, tutoriais e passo a passo para lidar com as crianças.
Como criança não vem com manual, manuais de todo tipo são colocados à venda. Tudo aquilo que os pais das gerações anteriores aprendiam com seus pais, os avós das crianças, no passado, hoje eles aprendem com os “especialistas”. Os pais estão sendo levados a acreditar que não dão conta. Na medida em que compram esta ideia sem pé nem cabeça, começam a consumir a educação dos especialistas. Cria-se a dificuldade para vender facilidade.
Assim, na opinião dos defensores da publicidade infantil, os pais precisam de educação para lidar com a propaganda e aprenderem a dizer não às crianças diante do bombardeio diário e ininterrupto de valores consumistas. Os pais serão educados a que exatamente? Fico aqui imaginando campanhas educativas falando aos pais coisas como: “diga não aos seus filhos”, “como ser firme com os pequenos”.
Seria a ideia dos defensores deste argumento, educar os pais a resistirem à publicidade? Difícil. Se forem educados a deixar a publicidade de lado, os pais podem simplesmente desligar a tevê. Podem ainda passar a boicotar produtos com publicidade abusiva ou, já pensarem que perigo? Os pais podem se organizar em movimentos que lutem pela regulamentação da publicidade infantil. Se pensarem em boicote será o fim do mundo.
O argumento “eduquem os pais” defende simplesmente que o problema da publicidade infantil se resume a uma questão de controle parental. Mas, não é bem isso. A publicidade infantil usa de artifícios de sedução com indivíduos que não possuem condições de resistir ao apelo. É como tirar doce da boca de criança e ninguém quer trocar este público alvo pelo adulto. É mais fácil culpar os pais do que fazer autocrítica e passar a anunciar para os pais, com lealdade. Eu tenho controle sobre meu filho e não quero que ele seja exposto a isto.
Este argumento absolutamente furado da necessidade de educação dos pais parte da premissa de que o anunciante é detentor de direitos supervenientes (sim, mais importantes) do que os da criança, da família, do resto da sociedade. O anunciante está sempre certo e pode anunciar sem limites. Quem puder, deve desejar e consumir. Quem não puder, deve desejar e chupar o dedo. Esta é a lei do mercado. Se aquele a chupar o dedo for alguém com dois anos de idade, tanto melhor. Isto criará um desejo que será revertido em consumo exacerbado assim que possível. Assim que der, o pai educado pela política do anunciante, faz uma prestação ou compra parcelado no cartão .
Os pais não precisam ser educados para criarem seus filhos. Não são adultos incapazes nem estão à mercê crianças. Os pais precisam daquilo que realmente lhes falta: INFORMAÇÃO. E curiosamente isto é algo que a publicidade infantil não trás. Pais bem informados acerca de todos os produtos, da dinâmica de sua produção e até das suas consequências, como impacto ambiental e política trabalhista das empresas anunciantes, escolhe melhor.
Por tudo o que foi falado acima, os produtos precisam ser anunciados para os pais. Se o produto é tão bom assim, anunciem para os pais, conversem com eles. Sejam claros sobre suas práticas. São os pais quem compram e não precisam ser educados para a paternidade, precisam de informação clara e de crianças livres de comunicação mercadológica.
(*) Vanessa é mãe do Ernesto, escreve no Mãe é tudo igual e adora contra-argumentar.
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