publicidade infantil / 25 de maio de 2016

Os esforços para criar uma criança numa sociedade de hiperconsumo

Texto especial para o Milc Mariana Sá*

Quem é mãe (ou pai) sabe a quantidade de esforço que precisamos fazer para cuidar bem de uma criança, para que ela tenha um desenvolvimento pleno e saudável, para que alcance o seu potencial pessoal, para que seja feliz, generosa, solidária e que tenha ferramentas para que, no futuro, se torne um cidadão autônomo e produtivo.

Nosso modelo de sociedade permite que tenhamos aliados que dividem conosco este esforço: os professores e profissionais de educação, os pediatras, psicólogos e nutricionistas, os brincantes e os artistas que produzem cultura e entretenimento para crianças, os políticos que elaboramos leis e ações para proteger as crianças e os publicitários.

Ops, eu disse publicitários??? Opa, saiu sem querer, desculpa… é que estava sonhando acordada com uma sociedade em que a infância realmente estivesse em primeiro lugar e que todos os cidadãos estivessem comprometidos com as crianças no seu “fazer” diário, inclusive anunciantes e publicitários. Neste mundo idílico, mesmo quem merca entraria com algum esforço no sentido de criar as crianças. Ou, pelo menos, não atrapalhariam.

Pelo menos não impediriam, via lobby e mais variadas chantagens, que os parlamentares de criassem mecanismos de proteção extra ao ser humano numa fase especial do seu desenvolvimento.

Se estas pessoas priorizassem, de fato, a infância plena e saudável, os parlamentares nem precisariam criar mais lei nenhuma: bastariam que publicitários respeitassem a legislação brasileira e o seu próprio código de conduta – o Código de Autorregulamentação Publicitária do Conar.

E é por isso que nos causa estranhamento quando uma mãe (ou um pai, ou um educador, ou um profissional da infância, ou um artista, ou um político) acha que o seu esforço pessoal de educar – de desligar a tevê e de dizer “não” – consegue fazer frente aos esforços dos publicitários em persuadir as crianças a quererem algo novo a cada 30 segundos na tevê, nas barras laterais da internet, em todas as esquinas da cidade, na escola e nos pontos-de-venda – supermercados, farmácias, etc.

Todo o esforço dos publicitários brasileiros está em atrapalhar os nossos esforços em criar cidadãos conscientes: eles querem criar um exército de consumidores que quanto mais alienados e egocentrados melhores serão para os negócios. E esta é a importância do debate e de acréscimos na nossa legislação que a torne mais clara para que anunciantes e publicitários parem de nos atrapalhar.

*  *  *

Ontem estive mais uma vez na Câmara dos Deputados, na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática para debater o PL 702/2011 que visa alterar o Estatuto da Criança e do Adolescente para restringir o horário em que as publicidades dirigidas à criança sejam exibidas. É uma medida com alcance e efetividade bastante limitados, mas é importante ter sempre uma mãe presente para ouvir os especialistas sobre os danos causados às crianças pela publicidade, ouvir os “argumentos” fracos do mercado a favor da manutenção das coisas como elas estão e solicitar que o Estado – por meio do parlamento – acompanhe as necessidades da sociedade e atualizem o ordenamento jurídico para que as proteções se efetivem.

(*) Mariana é mãe de dois, publicitária e mestre em políticas públicas. É cofundadora do Milc e membro da Rebrinc. Mariana faz regulação de publicidade em casa desde que a mais velha nasceu e acredita que um país sério deve priorizar a infância, o que – entre outras coisas – significa disciplinar o mercado em relação aos direitos das crianças.


Tags:  #publicidadeinfantil #publicidadeinfantilNÃO Audiência Pública câmara dos deputados PL 702/2011

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