Texto especial para o Milc de Claudia Visoni*
Quando a gente começa a pesquisar a origem do que está no prato, surge uma paisagem nem um pouco bonita. A começar pelo campo. No século 20, perdeu-se 75% da diversidade das culturas agrícolas e atualmente apenas quatro espécies (soja, trigo, milho e arroz) fornecem perto de 60% das calorias derivadas de plantas. Ou seja, quando a gente acha que coloca no carrinho um monte de alimentos diferentes, na verdade está levando para casa variadas combinações desses ingredientes (basta ler os rótulos). Carne, ovos, leite e laticínios, aliás, também derivam de milho e soja, pois essa é a base da alimentação dos animais.
Utiliza-se na lavoura convencional muito agrotóxico (o Brasil é o maior consumidor mundial, com 19% de todo o veneno agrícola do mundo), adubos sintéticos, sementes transgênicas e mecanização intensa. Esse modelo agrícola é altamente dependente de petróleo, grande emissor de gases do efeito estufa, extermina a biodiversidade, detona a fertilidade do solo e contamina quimicamente as fontes hídricas até mesmo subterrâneas. É importante lembrar que os transgênicos foram criados apenas para tornar as plantas resistentes aos agrotóxicos, e as sementes transgênicas são propriedade privada – portanto na verdade estamos participando de um grande experimento, já que tais sementes foram lançadas no mercado sem antes haver comprovação de que o consumo de alimentos transgênicos é seguro em longo prazo e seu plantio não prejudicará seriamente as matrizes genéticas naturais.
Aqueles que se importam com o bem-estar animal e a saúde pública ficam chocados com as condições de vida dos bichos criados para o abate. Frangos e suínos vivem em galpões superlotados em condições de vida tão ruins que recebem doses de antibióticos todos os dias devido a seu sistema imunológico debilitado, fator que predispõe ao surgimento de superbactérias.
Aqueles que se importam com a dignidade humana se chocam com as condições de trabalho nos latifúndios, onde ainda se escraviza, e nos frigoríficos (sugiro o ótimo documentário brasileiro “Carne, Osso”).
Nas indústrias, as commodities agropecuárias são misturadas a diversos conservantes, corantes, acidulantes, estabilizantes, muito sódio, açúcar e gordura de qualidade inferior para ter gosto de alguma coisa sem precisar usar ingredientes mais nobres. Assim a mercadoria tem custo baixo, não apodrece nem precisa ser reposta com freqüência, aumentando margens de lucro, evitando perdas e complicações logísticas.
O forte mesmo dos produtos alimentícios é a propaganda. Elas anunciam praticidade, sabor (artificial), vantagens para a saúde (em geral inexistentes) e apelam até para a natureza, sobretudo nas embalagens. Veja só o exemplo dos iogurtes e sucos de caixinha que abusam da imagem das frutas sem conterem doses significativas desse ingrediente na fórmula.
Alimentos naturais, os únicos que são nutritivos de verdade, não contam com divulgação na mídia, não têm marca nem anúncio. Adoro o livro “Em Defesa da Comida – Um Manifesto”, do norte-americano Michel Pollan. Veja só algumas sugestões que ele dá:
- Não coma nada que sua avó não reconheceria como comida.
- Evite comidas que contenham ingredientes cujos nomes você não consiga pronunciar.
- Não coma nada que não possa um dia apodrecer.
- Evite produtos alimentícios que aleguem vantagens para sua saúde.
Enfim, aquele tipo de comida que predomina nas gôndolas do supermercado só é perfeito para os negócios dos latifundiários, dos grandes frigoríficos, das indústrias processadoras e varejistas.
Para ficar fácil identificar as categorias, veja só algumas diferenças entre PRODUTO ALIMENTÍCIO e COMIDA DE VERDADE:
(*) Claudia Visoni é mãe, jornalista, hortelã e autora do blog Simplesmente
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