brinquedos e marketing / 18 de novembro de 2013

Furby: um jeito de diferente de ser – ou escolha um presente diferente para seu filho

Texto de Ana Andrade*

Como muitas famílias, acompanhamos aqui em casa o lançamento dos novos brinquedos – no caso do Furby, um brinquedo repaginado. Os lançamentos sempre vêm acompanhados de muita propaganda, são cativantes e obviamente deixam os pequenos pedindo por aquilo.

Tratamos aqui em casa desse assunto com muita calma. Com dois filhos em idades diferentes e expostos a essas novidades muitas vezes mais pelos colegas da escola do que propriamente pela TV, que aqui é pouco liberada, sempre batemos papo sobre a necessidade das novidades. A conversa sempre se utiliza do histórico recente: “Filho lembra aquele brinquedo tal, lembra que foi só usado uma semana e depois ficou engavetado? Lembra que a propaganda era toda trabalhada na ilusão e na real o brinquedo não entregava o que os publicitários vendiam?”

Depois observamos aquele objeto deixar de ser novidade e outro ocupar o destaque. A própria publicidade se encarrega de nos mostrar a efemeridade das coisas.

O pequeno e engraçadinho Furby foi o destaque do ano passado. Com valor nas prateleiras de quase R$ 400, ficávamos boquiabertos de ver que nos EUA ele custa quase US$ 50.

Por aqui acalmamos a vontade, até que… O filho de 10 anos viajou com o pai para os EUA, e muito empolgado e cheio de carinho, presenteia a irmã de quase quatro anos com o pequeno e engraçadinho brinquedo. Percebo que o presente agradava mais a ele do que a propria irmã, e nos primeiros dias ele se envolveu muito com o brinquedo. Como família participamos muito das brincadeiras e nos instruímos no site sobre a forma de cuidar, descobrimos que o “nosso” era uma novidade portanto o app desse ainda não está disponível aqui. Até achamos melhor, já que o Furby tb pode ser cuidado com as nossas mãos e não somente com o aplicativo do smartphone. Eu e meu marido estávamos também curiosos, lemos bastante, falamos em inglês com ele e tentamos até falar o furbish, que é a língua original do bicho. Ah, a faixa etária é de seis anos.

A primeira coisa que nos incomodou: o jogo de quatro pilhas AA durou dois dias apenas – problema que resolvemos usando as pilhas recarregáveis.

A segunda coisa é que o bicho do nada começa a falar. Não, não tem botão de volume e não tem botão de desligar. Somente abrindo com a chave de fenda e tirando as pilhas. Prático, não? Imagina às duas da madruga, depois que você está bem moída; o bicho deixa de ser engraçadinho para ser “incomodante”.

E pra finalizar, vamos ao motivo pelo qual escrevi este texto: o Furby desenvolve sua personalidade pela forma como é cuidado. Até aí, ok. Imagino que se vc chutar um cão este irá te morder, o que te faz concluir que o Furby ficará bravo se não for alimentado e acarinhado. Bravo é uma coisa, outra coisa é o bicho virar o demo.

Quando aconteceu pela primeira vez, eu estava na cozinha, as crianças brincavam na sala e ouvi algo que me lembrou do exorcista – o filme. Saí correndo pra sala e meu marido me acalmou: “Calma, ele está bem, parece que só o alimentamos demais.”

Da segunda vez meu marido relatou assustado o que ocorreu e fomos pesquisar na internet. Furby pequeno e engraçadinho, virou incomodante e agora ele tem Distúrbio Dissociativo de Identidade. Não sou da área médica portanto não tenho como falar sobre isso. Também não é engraçado e se você se colocar no lugar de uma criança que está se divertindo, vendo os olhinhos mágicos explodirem em corações, piscadelas, notas musicais e do nada o olho fecha, ele se balança todo e berra: “Changing, changing” (mudando). Os olhos abrem com labaredas de fogo, o bicho troca a voz e vira o demo. Não tem nada de divertido, não é para criança de qualquer idade, a não ser que você pratique satanismo ou algo parecido. Segundo a resenha do Gizmodo, é um brinquedo para crianças, crianças sozinhas, crianças negligenciadas, crianças de criminosos, crianças do mal etc.

Sim, dá medo e a criança entra em pânico. Sim, você pagou 400 pratas num brinquedo com uma doença mental.

E me pergunto: que tipo de mente doentia programa um brinquedo desses? Isso é um brinquedo? Que tipo de dano psicológico uma criança pode sofrer ao ver seu brinquedo amado virar isso? Como você se sente quando a infância, ao invés de protegida, é achincalhada?

Na sessão de perguntas do site oficial encontrei algumas perguntas sobre a personalidade, mas não tem nenhuma sobre ele virar o demo ou ter um distúrbio ou desordem mental.

Pesquisando, descobri um testemunho com algumas imagens em inglês aqui sobre o mesmo problema. Encontrei mais informações aqui, mas nenhuma sobre a realidade.

E pra terminar vou usar uma frase lá do Gizmodo: “It also provides a decent simulation of the scarring effects long term psychological and physical abuse can have on the psyche. At a medical school, it could teach valuable lessons. But it has no place at a child’s sleepover.”

Numa tradução livre: o “brinquedo” fornece uma simulação decente dos efeitos marcantes de um duradouro abuso psicológico e físico pode ter na psiquê. Numa faculdade de medicina, poderia até ser útil. Mas não cabe na hora de dormir de uma criança.

*Ana é mãe de dois, arquiteta, inquieta, escreve no quaseummoleskine, iniciou um projeto para embelezar Petrópolis com plantas e acredita que agora é a hora de ser feliz.

 

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Tags:  #publicidadeinfantil brinquedos consumismo infantil Furby publicidade de brinquedos

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Mariana Sá




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