destaque_home / maternidade / 27 de abril de 2015

Homens, ativismo e infância

Texto especial para o Milc de Debora Regina Magalhães Diniz, Mariana Sá e Vanessa Anacleto*

Frequentemente somos questionadas em relação à presença de homens na “coordenação” do Milc, já que o movimento é voltado para todos os pais. O fato é esse: hoje o Milc conta com a participação de vários homens, mas ainda estamos longe de ter pais ativistas pela infância que queiram se expor da maneira que nós nos expomos. Eles contribuem com o movimento – e muito! – mas não se sentem identificados com o “rótulo” pais ativistas e não demonstram desejo de estar na nossa página que dá autoria ao conteúdo. Não podemos obrigá-los a terem o mesmo “sanguenozóio” que temos quando estamos defendendo a infância.

E, já que somos mulheres dispostas a colocar nossa cara na janela, nos damos ao direito de nos identificarmos como “mães ativistas pela infância” e não como pais – como poderia ser perfeitamente cabível na nossa língua porque a palavra se refere aos homens e às mulheres, mas desconsideraria totalmente o protagonismo feminino, das mulheres, das mães, ora! Nós, mulheres que têm filhos, e que movimentamos esta causa, não nos sentimos representadas pela palavra “pais”. Por isso nos definimos lá nos primórdios do Milc como “mães (em primeiro lugar), pais e cidadãos comprometidos com a infância”.

Nós usamos com mais frequência em nossos textos imagens e referências às mães e acabamos reproduzindo o que, infelizmente, a sociedade ainda é, uma sociedade que acaba colocando os filhos como responsabilidade exclusivamente das mães, o peso da educação é ainda está sobre os ombros da mulher. Tanto que é comum ouvirmos, em cada problema relativo à criança: “onde está a mãe desta criança?”. É um desafio encontrar uma publicação masculina contendo colunas e reportagens sobre o cuidado paterno e os poucos que aparecem são tratados com “honra e glória”, ao contrário das mulheres.

Tentando traduzir a cobrança social machista relativa ao consumismo, lemos assim: ” a culpa é dos pais, mas, na verdade, queremos mesmo é culpar as mães, pois as mulheres são fracas, consumistas e fúteis”.

Quando, por algum cacoete nosso, damos o protagonismo às mães e esquecemos de mencionar os pais, somos logo chamadas à atenção: no primeiro ou no segundo comentário vem alguém clamar a inclusão dos homens na questão. E ficamos felizes, extremamente felizes, felizes de verdade! É feliz ver a sociedade clamando pela presença dos homens no cuidado com os filhos, com a casa e com a vida. E o nosso maior desejo é viver numa sociedade sem divisões de papel.

Outro dia, nós três estávamos reunidas e começamos a falar dos nossos companheiros, especialmente da maneira com que cada uma dividia com eles as tarefas de cuidado com a sua casa e com os seus filhos e ficamos extremamente felizes ao constatar que nossas escolhas nos levaram a um “modelo de governança doméstico” mais igualitário e participativo. Reparamos ainda que eles são grande incentivadores e apoiadores do Milc, usam o conteúdo do Milc em suas próprias condutas, se orgulham do Milc (mas não são Milc :p ).

Acho que dois mundos ainda estão convivendo: um mundo em que os homens acreditam numa divisão natural de tarefas por gêneros e se afasta das tarefas que consideram femininas (inclusive do cuidado com as crianças) e um outro mundo em que os homens sentem prazer e alegria na convivência doméstica e paterna. Vimos este vídeo e percebemos um sinal: https://www.youtube.com/watch?v=Ij0fByuuChs

pai-milc

O sinal de que, apesar de todo o machismo que ainda pesa sobre os ombros das mães, o clamor social para que os homens dividam com as mulheres as tarefas relativas aos cuidados, porque acreditamos que quanto mais gente se envolva na criação dos seres humanos, tanto melhor. E esperamos que este clamor vá se transformando em participação masculina paterna efetiva nas causas pró-infância ao ponto do Milc poder ser definido como um movimento de pais comprometidos com a infância, sem a necessidade de marcarmos protagonismos.

PS: Vale ressaltar que este texto diz pouco respeito aos casais homoafetivos que criam suas crianças, porque acreditamos que nestes casamentos as divisões de tarefas e os arranjos são feitos de uma maneira mais consciente, estamos corretas? 

 

(*) Debora é mãe de três, cofundadora do Milc, cursou Letras e Semiótica. É doula e educadora perinatal há 10 anos. Atualmente vive no Vale do Paraíba e é uma das coordenadoras da Roda Bebedubem. É ativista e implicante com a sociedade atual desde sempre. Co-fundadora do Milc e membro da Rebrinc.

Mariana é mãe de dois, publicitária e mestre em políticas públicas. É cofundadora do Milc e membro da Rebrinc. Mariana faz regulação de publicidade em casa desde que a mais velha nasceu e acredita que um país sério deve priorizar a infância, o que – entre outras coisas – significa disciplinar o mercado em relação aos direitos das crianças.

Vanessa é mãe do Ernesto, blogueira e autora do livro Culpa de mãe. Por causa disso tudo, ajudou a fundar o Milc e luta por um futuro sem publicidade infantil. É autora do blog materno Mãe é Tudo Igual e membro da Rebrinc.


Tags:  cuidado feminismo homem machismo mulher pai sexismo

Bookmark and Share




Previous Post
A menina funkeira e o linchamento virtual
Next Post
Sete dicas para uma alimentação infantil bacana



Mariana Sá




You might also like






More Story
A menina funkeira e o linchamento virtual
Texto especial para o Milc de Debora Regina Diniz* Há algum tempo estamos recebendo denúncias, links e "cobranças" de um posicionamento...