Na tarde da última sexta-feira, publicamos o texto abaixo sobre a conduta da empresa farmacêutica que distribui brindes e mimos para auferir elogios e menções de blogueiras maternas. O post, com caráter de denúncia, continha imagens de postagens de blogueiras devidamente modificados com tarjas e máscaras que preservavam a identidade dos retratados. Nas postagens as blogueiras avalizam o uso de suplemento vitamínico destinados a crianças.
Logo após a publicação do post, começamos a receber pedidos de blogueiras que desejavam ver as imagens, mesmo com tarjas e máscaras, retiradas. Foram seis pedidos de remoção ao todo para retirara de imagens que ainda estão na rede e podem ilustrar facilmente nosso ponto de vista. Conforme os pedidos iam chegando e de acordo com a nossa política sobre imagens explícita no blog, fomos removendo as fotos e, em dado momento, concluímos que sem as ilustrações, o texto começava a perder sentido.
Na madrugada de sábado (cerca de 12 horas após a publicação), decidimos retirar todas as fotos de blogueiras do post e reorganizá-lo sem modificar o seu conteúdo textual. Ao final da manhã, retiramos o post do ar, para poder republicar com o sentido de denúncia contra a ação de marketing (e não contra as mães-bloguerias) que nosso objetivo desde o início.
Encontramos assim uma forma para que o leitor do futuro possa continuar a compreender esta denúncia: todas as ilustrações pertinentes ao caso podem ser encontradas facilmente, e sem constrangimentos, em https://instagram.com/explore/tags/redoxitos
Antes de passar ao post-denúncia, porém, deixamos algumas ponderações:
1- NÃO ERRAMOS ao publicar exemplos do resultado da sedução exercída pela marca farmacêutica sobre as blogueiras. Fizemos ‘uso justo’ (fair use*) de material exposto na rede, para fazer denúncia de prática abusiva de publicidade. Não ocorreu qualquer forma de auferimento de lucro com a publicação deste post. Este é um blog sem fins lucrativos. Esta realidade, somada ao interesse público da denúncia e o fato das identidades estarem preservadas nos orienta a pensar desta forma;
2- COMPREENDEMOS ser direito do blogueiro aceitar mimos, brindes e até remuneração em troca de espaço e aval de produtos. Apenas estamos propondo uma reflexão sobre os limites deste direito;
3- LEMBRAMOS, por fim, que a maioria das imagens reclamadas ainda se encontra na rede, em sites, blogs e perfis públicos de blogs, servindo de propaganda para a indústria farmacêutica. São imagens que, pela nossa compreensão, poderão ilustrar denúncias de Procons, do Ministério Público e de consumidores ao Conar a qualquer momento. Afinal, com alimentação adequada não há necessidade de suplementação e vitamina C não é bala, como explica o médico Antônio Macedo Soares em entrevista a Drauzio Varella que pode ser lida na íntegra aqui:
“Drauzio – Muitas pessoas partem do princípio que, se vitamina não fizer bem, mal também não faz.
Alberto de Macedo Soares – Essa história de que vitamina, se não fizer bem, mal não faz, não procede. Como você bem colocou, antigamente, a tripulação dos navios tinha carência de vitamina C e desenvolvia escorbuto, uma doença que provoca sangramentos, porque os marinheiros passavam muito tempo em alto mar sem ingerir alimentos frescos. Hoje, porém, trabalhos mostram que a retirada abrupta de megadoses de vitamina C pode provocar um quadro semelhante ao de escorbuto, além de cálculo nos rins e distúrbios gastrintestinais.”
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Finalmente, o texto original!
com algumas adequações por conta da falta de imagens: agora vamos precisar das mais de 1000 palavras
Remédio não é bala
Há alguns dias publicamos um texto de uma blogueira inconformada com uma ação mercadológica para mães-mídia que enviou para sua casa um baleiro que servia de propaganda de remédio. Era claro, que a campanha se tratava da relação proposital entre o doce e a medicação.
A medicalização das crianças da nossa sociedade é uma realidade preocupante. E qualquer adulto que preze pela saúde do filho ou do coletivo de crianças para quem deixará seus legados, há de concordar que com medicação não se brinca. Para além dos efeitos nocivos do excesso de medicação promovido pela comunidade de saúde que hoje sabemos, muitas vezes pautada pelos interesses da indústria farmacêutica anda patologizando absolutamente todas as áreas da vida, tornando as coisas mais comuns da infância, como agitação e encantamento pela vida, doença a ser medicada, sabemos que criança e medicamento são duas coisas que não se misturam.
Todo e qualquer remédio deve ser mantido fora do alcance de crianças.
Surpreendentemente notamos no instagram uma movimentação (até o momento 422 posts) que já vem ocorrendo há meses de uma indústria farmacêutica assediando mães-mídia na promoção de um novo tipo de produto farmacêutico: vitamina C com abordagem ministrável para crianças. Todo o orgulho que sentimos do ostracismo a que as mães-mídia condenaram o Benegrip, agora se transformou em vergonha.
“Redoxitos é a vitamina C em formato de gominha que facilita o consumo para crianças de 4 anos ou mais. Agora nos sabores Morango e Frutas Tropicais eu provei é uma delícia.” conta uma das mães-mídia impactada pela campanha.
Fomos pesquisar como é que um produto de uma indústria farmacêutica, conquistou tão fácil aceitação e espaço entre o grupo de “formadoras de opinião” repetimos, à despeito de ser público e notório o fato de que remédio não é bala, esse produto foi largamente divulgado por genitoras em todo o país. Estamos nos questionando como é que um remédio disfarçado de bala tenha sido aprovado pela Anvisa, bem como o porquê de nossos recursos legais para coibir a publicidade infantil, que alavanca esse tipo de ultraje à saúde das crianças não estão sendo aplicados.
Notamos que a receita-de-bolo praticada pela grande maioria das marcas em campanhas dentro dos blogs maternos está literalmente executada na campanha de Redoxitos, com direito à todas as infrações éticas e legais possíveis, vejam nossa pesquisa:
+ Distribuição de amostras
+ Personagens/Mascotes em ambientes públicos
+ Publieditoriais
+ Inserção na TV
+ Convites de mães-mídia para eventos
+ Presença de celebridades
+ Agraciamento das crianças e adultos com brindes
Evento do Shopping Eldorado, SP
http://www.infobranding.com.br/acao-nas-ferias/
http://promoview.com.br/perfil/349966-grupo-talkability-crescimento-e-associacoes-marcam-2013/
Feira Mega Gestante, SP
Depois vai para a ação de publieditorial: compra de espaço em alguns blogs, e data do final do ano de 2014, se estendendo até o carnaval de 2015, sempre disseminando a ideia de que a Vitamina C é importante na alimentação das crianças, mas já provomendo o formato “bala” do produto farmacêutico (aqui haviam dois prints de blogs contendo publieditoriais):
Mais um publieditorial, este usando uma criança como garoto propaganda. Olha o tamanho da embalagem!!!
Na mesma época, é lançado o comercial de TV: um ode à publicidade dirigida para criança. Um garoto conta para o personagem “redoxitos” a história dos três porquinhos justificada pelo fato de que o lobo, que espirrava muito, destruía suas casinhas porque não tomava vitamina C.
https://www.youtube.com/watch?v=w8VlQrgMNvw <— se clicar, por favor negativem!
Envio de amostras para mães: quando também começa o envio do produto farmacêutico – acompanhado de cartas escritas à mão!!!! – para as mães blogueiras, que fazem mídia espontânea em seus canais.
Envio de brindes fofos para as crianças: o envio de brindes atinge as raias da loucura, e começa a chegar nas casas das blogueiras em formatos com grande apelo ao público infantil. Aqui escolhemos um print porque não seria possível descrever o apelo deste brinde apenas por palavras. Escolhemos um corte da busca onde não aparecem crianças (algumas blogueiras publicaram imagens dos seus filhos brincando com o brinde, o que comprova o apelo infantil) e protegemos as imagens onde as blogueiras possam ser identificadas pela intervenção que fizeram nas fotos (assinaturas, hashtags e elementos gráficos).
Prática ilegal da medicina? Nos prints que escolhemos e retiramos, via-se algumas blogueiras sugerindo automedicação comentários das postagens. Em alguns posts podemos ver comentaristas pergunta se a filha da blogueira faz uso do medicamento. Ao que parece, é uma informação que importa para uma tomada de decisão da seguidora, o que coloca as blogueiras em posições de grande responsabilidade. Percebemos que algumas blogueiras ressaltam a importância de checar com o pediatra, outras informam até as dosagens receitadas para seus filhos.
O que nos leva a convocar uma reflexão sobre a nossa responsabilidade como difusor de informações e a responsabilidade da indústria em dar instruções claras e vedar este comportamento perigoso: as blogueiras estão agindo com a maior boa vontade, tentando ajudar umas às outras: é papel da indústria capacitá-las para que não excedam os limites e é papel do grupo que se propõem a ser divulgadores de marcas a travarem estas discussões e interferirem quando deparam-se com mensagens perigosas. Você pode ver estes comentários, navegando de imagem por imagem na busca pela tag: https://instagram.com/explore/tags/redoxitos/
Promoção de evento: eis que a Bayer firma parceria com a Pixar Disney para promover o lançamento de um filme infantil, patrocinando a ida das mães-mídia e família à pré-estréia do filme.
Aqui víamos uma imagem do evento no cinema com apoio do produto farmacêutico. Mães e crianças estão diante de um painel com as marcas do filme e do produto. Existem fotos dos brindes da indústria entregues no evento na tag https://instagram.com/explore/tags/redoxitos/
Relatos do evento em blogs maternos, façam uma busca na web.
Celebridades: não se esqueçam das celebridades avalizando – estas sendo pagas, claro! – a marca. A seguir print do link da Ego:
Mimos: a marca e as amostras, dessa vez com brinquedos e atreladas à promoção do filme, seguem aparecendo nos canais digitais das mães-mídia escolhidas para a campanha, que continuam ignorando o fato do produto que divulgam se tratar de um produto farmacêutico que se associa com balinha de goma.
A autora da imagem original que ilustrava os mimos excluiu voluntariamente os seus posts com a tag e nos pediu que excluíssemos também, o que acatamos assim que soubemos do fato: vamos proteger a identidade dela a pedido da mesma, mas foi uma imagem como estas abaixo, onde não se pode identificar a autoria (print de corte da busca pela tag https://instagram.com/explore/tags/redoxitos/
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Responsabilidade do anunciante
Claro que a ação de marketing de Redoxitos tem objetivos claros de lançamento do produto e suposta explicação de seus benefícios focando certeiro no público que interessa: mães. Em especial, aquelas que tem maiores espaços midiáticos para espalhar a informação que essa indústria farmacêutica precisa.
No site do produto existe uma infinidade de jogos para atrair seu interesse, além de todo o caráter de marketing infantil, longamente descrito pela baliza normativa do Conanda, que considera essa prática abusiva e portanto ilegal. Fica claro que as crianças também são alvo dessa campanha. O objetivo não pode ser outro, se não fidelizá-los como clientes e consumidores dessa marca. Se não convidá-los a medicarem-se sozinhos. Se não fazer propositalmente a confusão entre bala e produto farmacêutico em suas cabecinhas. Se não colocar em nós, as mães-chatas a responsabilidade de criticar esse absurdo. Se não colocar as “mães chatas” nesta posição de denunciar a conduta de mães tão vítimas quanto nós.
E de colocar sob os ombros das mães de todos os lugares, a responsabilidade de “ensinar” para o filho, mesmo que a propaganda diga, o produto comprove, o amiguinho tome, o cinema corrobore, remédio não é bala.
(*) Fair Use – http://fairuse.stanford.edu/overview/fair-use/
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