Vale tudo?
[veja a primeira e segunda partes deste texto de Daniele Brito]
Cheguei até a acreditar que a única responsável por esse combate ao consumismo fosse eu, na condição de mãe. Ora, quem dá a cartada final, quem tem decisão de compra, quem tem o dinheiro sou eu, não meus filhos.
Mas onde fica a ética? Onde fica a responsabilidade do Estado? Pois a publicidade danosa dirigida ao público infantil gera impactos na vida das famílias e da sociedade.
Na época em que fumar era coisa de gente descolada, oferecer cigarros de chocolate para as crianças brincarem de imitar os adultos era considerado normal. Isso um dia JÁ foi permitido, vejam vocês.
Se olharmos atentamente, quantos produtos nos são oferecidos com o mesmo propósito? Com o mesmo embasamento cientificamente falso visando nosso conforto e a nossa praticidade? Quem aqui acredita que um suco de caixinha conserve as mesmas vitaminas que um suco natural? E as papinhas industrializadas para bebês com o selo da Associação Brasileira de Pediatria? E as bolachas recheadas enriquecidas com sais minerais e ácido fólico?
Se a gente cai nessas armadilhas, o que dizer de um criança em formação?
Como lidar?
Já comentei no meu blog que não proíbo, oriento. Dá mais trabalho, é verdade, mas acredito piamente que uma criança só se desenvolve no contato com a realidade.
Tenho a sorte de ficar um bom tempo em casa e com eles, de modo que estamos sempre conversando sobre tudo o que assistimos juntos na televisão. Nada é verdade absoluta, temos o dever de questionar tudo o que nos é oferecido de bandeja. Minha missão é tirá-los do reino da fantasia, do mundo mágico das possibilidades de consumo.
Otto pede tudo o que vê na televisão. Ele tem todo o direito de pedir, mas eu me reservo o direito de não comprar.
Sandálias de salto – Barbies – castelos cor de rosa – maquiagens – roupas erotizantes – infinitos acessórios – armas a laser – bonecos que incitam à violência – quem financia essa merda toda? Decidi que não seria eu.
Não tenho o costume de frequentar lojas de brinquedos. Não tenho o costume de comprar brinquedos. Não temos o costume de passear em shoppings, preferimos aproveitar o que essa cidade tem de melhor: as praias e os parques. Lá incentivo o brincar, a aproximação, o diálogo.
Ando na contramão, pois instituímos que as datas comemorativas ou comerciais – como queiram – é o dia em que eles ganham um brinquedo à sua escolha.
Isso os ensina a esperar e a ponderar suas vontades. Aos poucos fui ensinando o valor das coisas, o valor do dinheiro. Quando vamos escolher um brinquedo em uma loja, eles já sabem que há um limite. Quando digo para o Otto o preço, ele mesmo exclama: é caro! E eu emendo: precisamos disto? A resposta é sempre “não”.
Negar é um ótimo exercício para nós que vislumbramos outras possibilidades de oferecer bem estar e para eles, que saem da apatia em que a publicidade os coloca.
A lição
O consumismo nos deixa num estado de descontentamento permanente, nos deixa totalmente padronizados, sem identidade.
Nessa vida imaginária, em que comprando somos mais, não há amadurecimento.
Que o Brasil saia de seu estado letárgico e cumpra um papel que também é dele, estabelecendo regras claras que evitem a entrada da publicidade em espaços que são exclusivos das crianças.
Por isso, apoio o movimento Infância Livre de Consumismo.
*Daniele tem 32 anos e é estudante de Direito, mãe da Bia, de 9 anos, e do Otto, de 4, mora em Florianópolis/ SC e é autora do blog Balzaca Materna
v
Tags: #publicidadeinfantil consumismo consumismo infantil Daniele Brito legislação mídia políticas públicas publicidade