Texto especial para o Milc de Daniela Teixeira*
Com a proximidade do Natal, é comum que as crianças fiquem ansiosas com os pedidos de presente para o Papai Noel. Cada família tem a sua própria dinâmica de comemoração, mas é quase certo que a maioria termina presenteando os pequenos nesta época do ano. É natural, afinal, foram anos criando uma cultura de consumo em torno da festividade religiosa. Por isso mesmo, o Natal é uma data propícia para refletirmos sobre como estamos envolvendo os nossos filhos no consumismo e os efeitos que isso vem produzindo neles.
Já está mais do que comprovado que o estímulo ao consumo tem gerado problemas das mais diversas dimensões, afetando a saúde física e emocional das crianças, criando conflitos familiares, estimulando a agressividade e influenciando a valorização do materialismo como estilo de vida. Não dá mais para ignorar os alertas de que é necessário proteger as crianças das estratégias de marketing abusivas. Segundo relatório de 2016 da OMS, existem 41 milhões de crianças menores de 5 anos obesas em todo o mundo e os estudos já vinculam a obesidade a uma rotina sedentária e à promoção de produtos ultraprocessados.
Uma pesquisa recente realizada pela empresa de inteligência änimä com 647 pais e mães de crianças menores de 12 anos mostra que mais de 80% dos pais acham que a propaganda influencia o comportamento dos filhos, porém, apenas 46% conversam sobre o assunto em casa. Outro dado mostra que as atividades em que aos pais mais veem os filhos envolvidos são: brincando em casa, usando celular ou tablet e em frente à TV. Isso parece ser um reflexo da rotina familiar do brasileiro médio: enquanto os pais estão trabalhando fora, os filhos estão na segurança de suas casas, colados nas telas eletrônicas. Resultado? Maior exposição aos apelos da propaganda. Estratégias de unboxing, os famigerados vídeos de youtubers mirins desembrulhando brinquedos, influenciadores digitais e comerciais segmentados fazem parte do novo universo do marketing infantil. Não por acaso os youtubers são os que mais influenciam o consumo dos filhos e, também, os que encabeçam a lista de rejeição: 76% dos pais são contra o uso de youtubers nas propagandas infantis.
Mudar esta realidade não é fácil. O desafio é enorme para nós, mães e pais de crianças, especialmente porque as empresas e o Estado não cumprem com eficácia o dever constitucional de proteger as crianças. Muitas vezes, nós mesmos caímos nas armadilhas da vida moderna e estimulamos uma rotina voltada para o consumo dentro de casa. São brinquedos que substituem o livre brincar ou que promovem a violência, alimentos ultraprocessados no lugar de uma refeição pela facilidade de preparo ou pelo apelo comercial do personagem infantil e um celular como recompensa para a falta de tempo ou de paciência ou de disponibilidade para estar os filhos. Não é fácil e uma mudança de comportamento exige dedicação, paciência, apoio familiar e, muitas vezes, coragem para ir contra o que a sociedade dita como padrão. Neste Natal vamos tirar um tempo para refletir sobre como os nossos filhos estão imersos na cultura do consumo e, quem sabe, pedir para o Papai Noel coragem para mudar esta realidade em 2020.
* Daniela Teixeira é mãe de João e Mestre em Consumo pela Bournemouth University, na Inglaterra.
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